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O bem-estar do menor é prioridade no Direito de Família |
A alienação parental é um tema profundo e por muitas vezes polêmico. O termo foi sugerido nos anos 1980 pelo psiquiatra americano Richard Gardner que defendia que a prática deveria ser cunhada como síndrome, chamando então de Síndrome da Alienação Parental (SAP). O psiquiatra, já naquele tempo, alertava que tal síndrome, se não corretamente identificada e tratada, poderia acarretar em consequências dolorosas às crianças envolvidas.
Com o objetivo de proteger as crianças, preservar o direito de convívio familiar e ainda inibir e reprimir a prática, em agosto de 2010 entrou em vigor no Brasil a Lei 1.238 definindo a alienação parental do seguinte modo:
Art. 2º Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este.
Após 10 anos de vigência, a lei, que a princípio foi vista como uma grande evolução na área do Direito de Família, hoje divide opiniões sobre sua eficácia. Inclusive tramita no Senado Federal o PLS 498/2018 que propõe a revogação da Lei 1.238/10, como visto:
“O pedido de revogação partiu da CPI dos Maus Tratos, encerrada em dezembro de 2018. Durante os trabalhos da comissão, foi recorrente o relato de casos de mau uso da Lei da Alienação Parental por pais supostamente abusadores, que apresentariam denúncias falsas contra o ex-cônjuge para obter a guarda da criança e continuar com os abusos. Por isso, a CPI decidiu apresentar projeto para revogar a Lei da Alienação Parental.” ( Fonte: Agência Senado)
Ao invés de revogar a lei, a Senadora Leila Barros, por acreditar na sua importância, propôs alterações no texto que foram aprovadas pela Comissão de Direitos Humanos (CDH). As alterações incluem a criminalização da falsa acusação de alienação parental, prevendo até a pena de reclusão.
É nesse fundo conturbado que a Justiça busca julgar e combater as práticas de alienação parental que são levadas ao seu conhecimento, sempre tendo em vista o melhor interesse da criança envolvida.
O STJ já julgou diversos casos envolvendo a alienação parental, mas alguns se destacam pela relevância do posicionamento firmado, são eles:
1️⃣ CC 94.723 - 24/09/2008
Esse Conflito de Competência foi o primeiro caso julgado pelo STJ relacionado à alienação parental. A controvérsia gira em torno da competência para julgamento da ação de modificação de guarda uma vez que várias ações relacionadas ao divórcio do casal e à guarda dos filhos tramitam em Goiânia, mas a genitora havia fixado residência junto com as crianças no Rio de Janeiro, sob a proteção do Programa de Proteção a Vítimas e Testemunhas Ameaçadas (Provita) uma vez que alegava que o pai era violento e teria agredido sexualmente os filhos.
Ficou reconhecido no processo, através de laudos e estudos psicológicos que a mãe estava implantando falsas memórias nas crianças e assim o Ministro Aldir Passarinho Junior votou por aplicar à demanda o disposto no art. 87 do CPC/73, afastando a incidência do art. 147, I do ECA.
2️⃣ REsp 1.330.172 - 11/03/2014
Nesta demanda discute-se o recurso cabível para impugnar a decisão proferida em incidente de alienação parental instaurado em ação de reconhecimento e dissolução de união estável.
Para a resolução da lide, a Ministra Nancy Andrighi alegou que a Lei 12.318/10 estabelece que o reconhecimento da alienação parental pode acontecer em ação autônoma ou incidentalmente. Se a questão for objeto de ação autônoma ou resolvida na própria sentença, deve ser impugnada através da apelação. Agora, se declarada incidentalmente, tal ato judicial tem natureza interlocutória e deve ser atacada através do agravo, conforme artigos 162, §2º e 522 do CPC/73.
3️⃣ REsp 1.591.161 - 21/02/2017
Lide na qual se discute o deferimento da guarda compartilhada no caso de existir desavenças entre os genitores. Nesta ação de regulamentação de guarda e visitas o genitor alega que após a separação a mãe da criança impõe obstáculos e dificulta a convivência familiar e requer o deferimento da guarda compartilhada.
O Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, ao discorrer sobre o instituto, ponderou que:
“No mundo ideal, para que a guarda seja proveitosa para os filhos, seria imprescindível que existisse entre os pais uma relação marcada pela harmonia e pelo respeito, na qual não se identificassem disputas nem conflitos. Porém, por óbvio, tal realidade não é usual nos litígios envolvendo questões de família. Assim, a guarda compartilhada passou a ser a regra, independentemente de concordância entre os genitores acerca de sua necessidade.
A implementação da guarda compartilhada não se sujeita, portanto, à transigência dos genitores.
E no caso concreto, não há peculiariedades que inviabilizem sua adoção, tendo em vista o contexto dos autos, que lhe é favorável (laudo social de fls. 209-210; declaração da avó paterna fls. 256-257, laudo psicológico de fls. 277-279 e laudo complementar fls. 481-484).” ( REsp 1591161/SE, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 21/02/2017, DJe 24/02/2017)
4️⃣ AgRg no AREsp 992.812 - 17/11/2016
Caso em que o genitor foi acusado pelo crime previsto no art. 217-A do CP por ter constrangido sua filha criança à prática de atos sexuais.
No recurso alegou que a condenação violava os princípios da ampla defesa e contraditório por ter negado a vigência do art. 5º, §2º da Lei 12.318/2010 e indeferido a perícia psicossocial requisitada pela defesa. Também alegou a nulidade do laudo psicológico por ter sido realizado em desconformidade com o artigo citado.
O Ministro Sebastião Reis Júnior negou provimento ao recurso e manteve a condenação fixada em 14 anos de reclusão por considerar que as instâncias ordinárias concluíram pela inexistência de indícios de alienação parental. Concluiu o Ministro que, sendo o art. 5º, §2º da Lei 12.318/2010 taxativo no sentido da perícia depender da existência de indícios da prática, não há negativa de vigência do artigo.
Asseverou ainda que decidir de modo diverso dependeria do reexame de provas, o que é vedado pela Súmula 7/STJ.
5️⃣ AgInt no AREsp 898.302 - 07/03/2017
A controvérsia do recurso cinge-se em torno da fixação de astreintes no caso da genitora dificultar as visitas do ex-cônjuge à filha menor do casal.
A sentença aplicou multa à genitora por atos de alienação parental. O TJRJ confirmou a aplicação da multa para cada fim de semana que o pai tivesse o direito de exercer a visitação da filha negado, mas diminuiu o valor.
A mãe alega que a multa, nos termos do inciso I do art. 6º da Lei nº 12.318/2010 , só é devida após a advertência, o que não ocorreu no caso. O Ministro Moura Ribeiro negou provimento ao recurso sob o argumento de que a incidência da multa apenas ocorrerá se a genitora descumprir a ordem judicial, salientando que:
“Portanto, como sublinhado no parecer ministerial, o que se verifica, na verdade, é que a Corte local decidiu de acordo com a pretensão da recorrente, haja vista que a advertiu sobre a aplicação da multa (somente) em caso de descumprimento do quanto estabelecido em sentença no tocante à visitação do recorrido à filha menor (e-STJ, fl. 361).”
( AgInt no AREsp 898.302/RJ, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 07/03/2017, DJe 20/03/2017)
6️⃣ AgInt no REsp 1.808.964 - 09/03/2020
Recurso no qual se discute o indeferimento da guarda compartilhada por não atender o princípio do melhor interesse da criança. Caso em que há alegações recíprocas de alienação parental e cenário extremamente conturbado entre os genitores.
O Ministro Moura Ribeiro votou no sentido de manter o indeferimento da guarda compartilhada nos seguintes termos:
Em situações excepcionais e em observância ao referido princípio, a guarda compartilhada não é recomendada, devendo ser indeferida ou postergada, como no caso em análise, no qual existem peculiaridades que não podem ser desconsideradas e inviabilizam a sua adoção, pois as condutas dos genitores ao longo do processo não observam o melhor interesse dos seus filhos menores.
E tais condutas dos genitores das duas crianças menores, constatadas pelas instâncias ordinárias e que não podem se revistas em recurso especial em virtude do óbice da Súmula nº 7 do STJ, não recomendaram a adoção da guarda compartilhada, mantendo, até que houvesse uma mudança de postura dos genitores das crianças, a guarda unilateral em favor da mãe L.
( AgInt no REsp 1808964/SP, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 09/03/2020, DJe 11/03/2020)
7️⃣ HC 550.132 - 05/05/2020
Caso curioso. O presente HC foi impetrado em favor do advogado visando ao trancamento da ação penal no qual é réu por ter praticado o crime previsto no art. 344 do CP.
Os autos narram que o advogado teria entrado em contato com a médica indicada para elaboração do laudo na ação de alienação parental e guarda em que atua e usado de grave ameaça para constranger a médica a “desdizer” o laudo que juntou nos autos da ação pois seria prejudicial ao seu cliente e que se não o fizesse iria fazer o possível para prejudicar a médica, incluindo denunciá-la no CRM.
O Ministro Nefi Cordeiro denegou a ordem por entender que as instâncias ordinárias concluíram que há justa causa para a ação penal tendo em vista os elementos trazidos aos autos e que decidir de forma diversa demandaria reexame fático-probatório o que não pode ser realizado via Habeas Corpus.
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